A história do equipamento desta via na verdade não tem grande história e terminou como quase todas as outras: desidratado, com uma fome de cão, uma sede de elefante e o arnês bem vincadinho no corpo. Pelo meio, duas descidas falhadas para encontrar a via (com a consequente e penosa subida a jumar) e a descoberta de um sector – Sector Perdido – para alimentar o insaciável animal abridor de cor Roxa…
Mas o que deixou melhores recordações foram as primeiras ascensões... A história foi sempre a mesma: gemidos, gritos e correspondentes festivais de baldos. As personagens também não mudaram: o careca e o emigrante. Mas os papéis de frouxo e salvador, esses sim, foram-se invertendo.
Se bem me lembro na primeira tentativa eu era o frouxo, com uma tendinite recém curada e sinais evidentes de inactividade: músculos flácidos e arnês encolhido com a lavagem. O primeiro largo, descontraído, causou umas contracturas ao frouxo, isto é, ao emigrante e umas gargalhadas ao salvador, isto é, ao careca. No segundo, de aquecimento, o frouxo sobreaqueceu e o careca passou para a frente da corrida. No terceiro largo, ainda mal dada a partida, já se estava a voar e quando tudo parecia mais tranquilo a coisa começou a ficar tremida, a protecção afastada e o baldo eminente...
Apesar de tudo chegámos à base do quarto largo, o difícil e verdadeiro. Aqui o frouxo armou-se em salvador mas não passou da segunda expresse e da meia dúzia de pequenos tralhos. O careca voltou a tomar as rédeas. Não isento de belos baldos e como se de alta montanha se tratasse, foi conquistando o P3, o P4 e o P5. Entre ponto e ponto baixava à reunião, não para descansar, mas para assustar o frouxo com os seus voos rasantes. No P5 a coisa complicava-se pois acabavam-se os “pês” (de pernos) e teríamos de recorrer aos “ás” de amigos, vulgo friends. Duas vezes chegou ao A1, mas das duas vezes voltou a ameaçar o frouxo que tremia penduradinho da reunião.
Começava-se a falar de plano de fuga e de abandonos mas é aqui que surge a verdadeira figura do salvador. Pela terceira vez arrastava-se até á fissura do A1. Os braços, como nas vezes anteriores não davam para mais e só o recurso a um movimento totalmente inédito na escalada, o LAM (Lançamento com o Amigo na Mão), salvou a situação. Devo referir que foi usado na sua variante “à vista” e rapidamente agarrado com a mão colocadora. O inchaço era tal que esta mão não resistiu nem dois segundos e o careca, com cara de pânico redobrada e já no ar, voltou a recorrer a um movimento inovador e fazendo um SEVA (solta e volta agarrar). Este movimento, o mais complexo e rebuscado da história da escalada, consiste em soltar a única mão que nos prende á parede, isto é ao friend e, já no ar, agarrar o friend com a outra mão. Já na tranquilidade de um amigo mal posicionado, a gargalhada foi geral e com este repertório, chegar ao fim do largo e ao fim da via foi canja.
Nas repetições que se seguiram, houve inversões de papéis, mas a história, o medinho e os belos voos foram os mesmos. Tentaram-se novas técnicas, como a introdução da figura do fotógrafo para aumentar a pressão, também sem grandes resultados, e ao ritmo de uma ou duas ascensões anuais a via foi resistindo aos encadeamentos.
No ano passado o assédio deu os seus frutos e o emigrante trocou de papel com o fotógrafo. O emigrante, agora escocês, passa a alternar com o careca os papéis de salvador e frouxo feliz. Pelo ambiente e emoções fortes que passámos, a via ficou conhecida como a tomatada. O teatro está aberto a novas personagens e as repetições aguardam-se.
Emigrante
Nota: nos papéis de careca, emigrante e emigrante escocês, respectivamente, Filipe Costa e Silva, Francisco Ataíde e Carlos Simes “Cuca” (autor da foto acima).
Mas o que deixou melhores recordações foram as primeiras ascensões... A história foi sempre a mesma: gemidos, gritos e correspondentes festivais de baldos. As personagens também não mudaram: o careca e o emigrante. Mas os papéis de frouxo e salvador, esses sim, foram-se invertendo.
Se bem me lembro na primeira tentativa eu era o frouxo, com uma tendinite recém curada e sinais evidentes de inactividade: músculos flácidos e arnês encolhido com a lavagem. O primeiro largo, descontraído, causou umas contracturas ao frouxo, isto é, ao emigrante e umas gargalhadas ao salvador, isto é, ao careca. No segundo, de aquecimento, o frouxo sobreaqueceu e o careca passou para a frente da corrida. No terceiro largo, ainda mal dada a partida, já se estava a voar e quando tudo parecia mais tranquilo a coisa começou a ficar tremida, a protecção afastada e o baldo eminente...
Apesar de tudo chegámos à base do quarto largo, o difícil e verdadeiro. Aqui o frouxo armou-se em salvador mas não passou da segunda expresse e da meia dúzia de pequenos tralhos. O careca voltou a tomar as rédeas. Não isento de belos baldos e como se de alta montanha se tratasse, foi conquistando o P3, o P4 e o P5. Entre ponto e ponto baixava à reunião, não para descansar, mas para assustar o frouxo com os seus voos rasantes. No P5 a coisa complicava-se pois acabavam-se os “pês” (de pernos) e teríamos de recorrer aos “ás” de amigos, vulgo friends. Duas vezes chegou ao A1, mas das duas vezes voltou a ameaçar o frouxo que tremia penduradinho da reunião.
Começava-se a falar de plano de fuga e de abandonos mas é aqui que surge a verdadeira figura do salvador. Pela terceira vez arrastava-se até á fissura do A1. Os braços, como nas vezes anteriores não davam para mais e só o recurso a um movimento totalmente inédito na escalada, o LAM (Lançamento com o Amigo na Mão), salvou a situação. Devo referir que foi usado na sua variante “à vista” e rapidamente agarrado com a mão colocadora. O inchaço era tal que esta mão não resistiu nem dois segundos e o careca, com cara de pânico redobrada e já no ar, voltou a recorrer a um movimento inovador e fazendo um SEVA (solta e volta agarrar). Este movimento, o mais complexo e rebuscado da história da escalada, consiste em soltar a única mão que nos prende á parede, isto é ao friend e, já no ar, agarrar o friend com a outra mão. Já na tranquilidade de um amigo mal posicionado, a gargalhada foi geral e com este repertório, chegar ao fim do largo e ao fim da via foi canja.
Nas repetições que se seguiram, houve inversões de papéis, mas a história, o medinho e os belos voos foram os mesmos. Tentaram-se novas técnicas, como a introdução da figura do fotógrafo para aumentar a pressão, também sem grandes resultados, e ao ritmo de uma ou duas ascensões anuais a via foi resistindo aos encadeamentos.
No ano passado o assédio deu os seus frutos e o emigrante trocou de papel com o fotógrafo. O emigrante, agora escocês, passa a alternar com o careca os papéis de salvador e frouxo feliz. Pelo ambiente e emoções fortes que passámos, a via ficou conhecida como a tomatada. O teatro está aberto a novas personagens e as repetições aguardam-se.
Emigrante
Nota: nos papéis de careca, emigrante e emigrante escocês, respectivamente, Filipe Costa e Silva, Francisco Ataíde e Carlos Simes “Cuca” (autor da foto acima).
3 comentários:
É só rir, só rir...adorei ler e relembrar as vossas peripécias e os sarilhos em que se metem cada vez que vão p'ráquele cantinho de pedra/terra e chorões!!!
Seria melhor pararem de tentar disfarçar que cada vez que lá vão tentam matar-se um(ns) ao(s) outro(s)!!!!!
ôps!... Eu posso explicar... ah... é... quer dizer... não sou eu na foto. É outro careca!... Sabes como são os escaladores, é tudo mentira. Um exagero. Eu não queria ir! Fui obrigado. É isso. Arrastaram-me! Fui, mas contrariado...
Que grande tomatada de história!! Parabéns
Ó Ana eu tenho provas irrefutáveis do careca a passar muito medo nesses calhaus...
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